domingo, 6 de dezembro de 2009

Monografia do curso de especialização em MKT Politico, USP- 2006

O POLÍTICO DO FUTURO:
DESAFIOS DIANTE DA REVOLUÇÃO TECNOLÓGICA E DAS EXIGÊNCIAS DE INTERATIVIDADE

-UMA REFLEXÃO DO IMPACTO DA TECNOLOGIA DIGITAL SOBRE A ATUAÇÃO DO POLÍTICO CONTEMPORÂNEO-



Monografia apresentada ao Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, em cumprimento parcial às exigências do Curso de Especialização, para obtenção do título de Especialista em Marketing Político e Propaganda Eleitoral, sob a orientação do Prof. Dr. MASSIMO DI FELICE.



KATIA GIULIETTI




UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
Escola de Comunicação e Artes
Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo
Curso de Especialização em Marketing Político e Propaganda Eleitoral
São Paulo, 2006





Para Maneco, eterna inspiração, parceiro incondicional de meus “vôos” - tanto no sentido figurado como no literal



AGRADECIMENTOS


A Deus -gracias a la vida (que me há dado tanto);

Ao meu filho, Conrado -amore mio;

À minha família -que entendeu minhas ausências;

Às “irmãs” Céu e Marisa –pelo incentivo;

Aos colegas de classe -pela alegria -em especial a Cíntia, pela força com o sumário, e a Silvio Reis, agradável companheiro do trajeto sabatino, entre Praia Grande e São Paulo.

À professora Katia Saisi -espelho;

Aos amigos Beth, Álvaro, Cecília e Carlos –pelos papos deliciosos, mesmo que inconstantes;

Ao professor Massimo -pela orientação neste trabalho e entusiasmo pelo assunto.




“Si todos los ríos son dulces de dónde saca sal el mar?”

Pablo Neruda




RESUMO


GIULIETTI, Katia. O Político do futuro: desafios diante da revolução tecnológica e das exigências de interatividade.

Monografia. Curso de Especialização da Universidade de São Paulo. São Paulo. 2006



A interatividade proporcionada pela tecnologia digital mudou o esquema tradicional de comunicação, de emissor para receptor. Na sociedade em rede, onde a mensagem pode ser constantemente modificada e emissor e receptor têm seu papel confundido, pois ambos atuam simultaneamente, ocorre uma ruptura que afeta na essência a atuação do político, nos moldes como a conhecemos.
A narrativa da dominação, presente na forma de comunicar da era analógica, vive seus últimos momentos, atingindo a forma do “fazer política”.
A ação de quem se pretenda representante popular vai além do político, exigindo maior capacidade de articulação que de convencimento para alcançar as demandas do público.
A revolução tecnológica e a interatividade encerram a era das transformações iniciada com a escrita. Atingem tudo que na sociedade sobrevivia tendo como base o discurso do poder, centrado na passividade do receptor. Essa postura passiva é aniquilada pela interação, provocando alterações sensíveis na linguagem, na postura e na forma de ser do político do futuro.



Palavras-chave: interatividade, novas tecnologias de comunicação, era digital, política


ABSTRACT

Interactivity made possible by digital technology has changed thetraditional communication flow, based on the duality of sender and receiver.In the network society, where the message can constantly be modified andsender and receiver have their role messed up, since both can actsimultaneously as one and other. There occurs a rupture that can affect theessence a politician performance the way we know it.
The dominationnarrative, present in the analogical age communication, lives its lastmoments. It alters the forms of “making politics”.
The actions those whointend to become a popular representative goes beyond the politician,demanding a bigger capacity of articulation than that of persuasion in orderto reach the public demands.
The technological revolution and theinteractivity lock up the age of transformations initiated with the writing.They reach everything that was based on the discourse of the power, centeredin the receiver passivity. Such passive position is overcome by interaction,having generated sensible alterations in the language, the position and theform of being of the politician of the future.




Keywords - Interactivity, new technologies of communication, digitalage, politician


SUMÁRIO


INTRODUÇÃO.............................................................................................................11
CAPÍTULO 1 – COMUNICAÇÃO E POLÍTICA.....................................................13
1.1 O ESPETÁCULO NAS PRAÇAS GREGAS
1.2 O POLÍTICO: QUEM É E COMO TRABALHA
1.3 A POLÍTICA NA ERA ANALÓGICA

CAPÍTULO 2 – SOCIEDADE EM REDE....................................................................18
2.1. OS MEIOS DIGITAIS E A INTERATIVIDADE
2.2. COMUNICAÇÃO ANALÓGICA E COMUNICAÇÃO DIGITAL: UMA RUPTURA
2.3. A POLÍTICA NA ERA DIGITAL

CAPÍTULO 3 – IMPACTO DAS NOVAS TECNOLOGIAS...................................... 22
3.1. PÓS-POLÍTICA DE COMUNICAÇÃO: NOVOS TEMPOS
3.2. MANDATO EM TEMPO REAL: CONECTADO COM O ELEITOR
3.3. ALÉM DO POLÍTICO: ADAPTAÇÃO À ERA DIGITAL


CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................... 27

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................... 29
ANEXOS......................................................................................................................... 32



INTRODUÇÃO


“Senhoras e senhores, caros eleitores: prometo trabalhar com afinco e determinação por melhorias que garantam a elevação da qualidade de vida de todos”. Esta frase pode ser a síntese de um discurso de um candidato a cargo eletivo que basta por si só num cenário de comunicação analógica. É característica da forma de comunicar na qual sobre o receptor é despejada a mensagem enviada pelo emissor. É eficaz, se recebida sem ruídos, no contexto das três primeiras revoluções comunicativas: a escrita, a Imprensa e a elétrica/eletrônica.
O discurso da era analógica, ainda tão presente no cenário eleitoral, não difere, embora milênios tenham se passado, da forma de comunicar do teatro grego. Passivamente, o público vai conhecer personagens representativos do Bem e do Mal e refletir, por exemplo, se Electra, de Eurípides, pode unir-se carnalmente a seu irmão Orestes. Deus Ex-Machina decidirá.

NA: Deus Ex-Machina - expressão latina que significa literalmente "Deus surgido da máquina". A expressão é uma tradução da língua grega e sua origem está no teatro antigo da Grécia, relativa a um inesperado evento, introduzido repentinamente em um trabalho de ficção ou drama, que ocorre para resolver uma situação ou desemaranhar uma trama. Esse deus, segundo a wikipedia, “ amarrava todas as pontas soltas da história”.

Há um espaço claramente determinado para o papel de cada um na comunicação analógica: de “A” para “B”, como a parede invisível a separar atores e público no teatro da antiga Grécia. “A” emite sua mensagem; o público/eleitor (“B”) vai recebê-la, com os sub-códigos, interpretações e rumores que essa forma de comunicar abrange.
“Tudo brota do mesmo princípio”, como afirma Aléxis de Tocqueville ao explicar o êxito da sua narrativa sobre as mudanças na França e nos EUA, “onde todas as leis derivam da mesma linha de pensamento”. Essa narrativa cabe na era analógica. Já, por outro lado, para o mesmo Tocqueville, seria um desvario filosófico tentar aplicar a mesma narrativa para julgar a Inglaterra, com sua cultura de qualidade ”descontínua e imprevisível”. O mesmo desvario ocorreria se tentássemos aplicar aquela narrativa “que brota do mesmo princípio” nos atuais tempos de comunicação digital, de sociedade em rede, na qual não se sabe mais de onde a informação se originou.
A passividade do receptor, na forma de comunicar da era analógica, mesmo com a possibilidade de recall, faz florescer a narrativa da dominação, e portanto, encontra terreno fértil para o pensamento único.
Como afirmam Bobbio, Matteucci e Pasquino, o conceito de Política está intimamente ligado ao de Poder. E este muitas vezes é definido como a dominação que um homem impõe a outro.
Para a perpetuação do Poder reduz-se o papel do cidadão: tanto faz se vota ou se assiste a uma peça teatral. A ele cabe apenas aprovar ou reprovar o político; aplaudir ou vaiar os atores.
Juntem-se os elementos básicos da Política (o espetáculo, o conteúdo e a competição, os mesmos presentes na tragédia grega) à dominação inerente ao Poder e teremos a fórmula ideal da narrativa do autoritarismo -mesmo que este esteja travestido de neoliberalismo e sua ilusão sobre o livre arbítrio do cidadão.
Nesta nova era, que denominamos de digital para resumir todas as novas tecnologias que permitem a interatividade, não há mais segredos. A Internet devassa vidas. Em função disso, cabe mais nestes tempos atuais a célebre frase de Abraham Lincoln -”Podemos enganar alguns por todo tempo, todos por algum tempo, mas não podemos enganar todos por todo tempo.” A acessibilidade e a velocidade das informações indubitavelmente transformarão a frase do ex-presidente norte-americano em “é curtíssimo o tempo no qual alguém pode ser enganado”.
Vivemos um momento de ruptura, no qual agoniza o pensamento único. A interatividade é a principal arma a fazer sangrar a narrativa da Política como a conhecemos, da dominação. Está em seus estertores a forma de comunicar da era analógica, que viveu grandes revoluções, iniciadas com a escrita.
Essa forma de comunicar, no entanto, não encontra mais espaço na era digital. Vivemos numa “sociedade em rede”, na qual não se encontra mais “o fio da meada”. Esse fio simplesmente não existe. Na nova revolução, os avanços da tecnologia obrigam a uma interatividade antes impensável.
Já não há mais a comunicação de mão única: emissor para receptor. Já nem estão mais separados os dois papéis daquela primeira forma: o emissor e o receptor são uma mesma fonte. Isto é interatividade. Uma troca permanente.
Nesse novo cenário, a forma de fazer política necessariamente muda, sob pena de o político ser sepultado. Acaba o mito da transparência e o saber passa a ser a consciência da pluralidade dos universos culturais.
Este trabalho pretende fazer uma reflexão sobre esse novo cenário para apontar alguns caminhos de como deverá portar-se o político antenado com esse novo quadro. O objetivo geral é o de apresentar algumas diretrizes para a atuação do político do futuro diante do surgimento de novos tipos de participação e de atuação da cidadania. Especificamente, pretende-se fazer uma análise do impacto das novas tecnologias sobre o político contemporâneo, uma interpretação sobre a força dos blogs e sites políticos e uma reflexão sobre como a interatividade obrigará a uma mudança na forma de atuação, na postura e na linguagem desse novo político.

CAPÍTULO 1 – COMUNICAÇÃO E POLÍTICA


1.1 O Espetáculo Nas Praças Gregas


Mais que entreter ou gerar catarse, o teatro na Grécia Antiga era o espaço perfeito para a comunicação do poder, para o exercício da democracia como a vista por Sófocles: a melhor forma de aproximação do homem com os deuses. É no palco grego que os valores são transmitidos. O espaço público da política grega era o teatro. Os dramas encenados serviam para educar a população sobre o bem e o mal e, de forma sub-reptícia, fazer com que a mensagem do Poder chegasse à maioria da população. A solução ao conflito, dada pelo Deus Ex Machina, era soberana, por mais incongruente que fosse.
Primeiro espaço público da política ocidental, o teatro grego reproduzia os preceitos religiosos da “imortalidade feliz” assegurada pelo culto aos antepassados. A religião, as noções sobre a propriedade, a moral e a origem do direito privado surgem na Grécia com a ghénos: a casta da aristocracia, cuja voz se fazia ouvir nas representações teatrais.
A Tragédia e a Comédia foram aperfeiçoadas pelos atenienses, que amavam o teatro. Os atores eram todos homens e os múltiplos personagens eram representados por máscaras. A narração era feita pelo coro. Na tragédia, os temas recorrentes eram o medo, a punição e a justiça divina. Já a comédia tratava de temas mais relacionados à política e às figuras da época.
Segundo Aristóteles, numa de suas versões sobre o surgimento da arte, o teatro nasceu das celebrações e ritos ao deus do vinho, Dionísio, quando as pessoas bebiam até ficarem embriagadas e então conseguiriam contato com o sobrenatural. Homens fantasiados de bodes encenavam o mito de Dionísio e do vinho.
O teatro como espaço político pode ser mais evidenciado nas peças de Sófocles, que escreveu verdadeiras odes à democracia. Mas qual democracia? A do coro, ou seja, a que emitia a mensagem do poder. E sempre sob ameaças: aquele que não respeitasse a democracia representada pelo coro, e procurasse se auto-governar, “teria como resultado final aquele mesmo destino que destemidamente lutava contra”.
Grandes conflitos filosóficos do Direito são debatidos no teatro grego. Na tragédia Antígone, de Sófocles, por exemplo, o diálogo entre Hémon e seu pai Creonte é uma grande batalha entre o Direito Natural e o Positivo - aquele aceito como costumeiro e de origem divina e este baseado nas leis estabelecidas pelo governante.
O embate ocorre porque Creonte, tirano de Tebas, proibira que se prestassem honras fúnebres a Polinice, que morrera junto ao irmão Etéocles, alegando que aquele tentara uma aliança com seus inimigos. Antígone, irmã de ambos, desobedece à ordem de Creonte e promove ritos funerários a Polinice. Pela transgressão, é condenada à morte. Hémon, noivo de Antígone, vai a Creonte implorar pela vida de sua amada. Dá-se então o seguinte diálogo:

"Hémon – Ouve: não há Estado algum que pertença a um único homem!

Creonte – Não pertence a cidade, então, a seu governante?

Hémon – Só num país inteiramente deserto terias o direito de governar sozinho!

Creonte – Bem se percebe que ele se tornou aliado dessa mulher!

Hémon – Só se tu te supões mulher, porque é pensando em ti que assim falo.

Creonte – Miserável! Por que te mostras em desacordo com teu pai?

Hémon – Por que te vejo renegar os ditames da Justiça!

Creonte – Por acaso eu a ofendo, sustentando minha autoridade?

Hémon – Mas tu não a sustentas calcando aos pés os preceitos que emanam dos deuses!"

Como destaca o professor Reinério Luiz Moreira Simões, “o crime de Antígone foi obedecer aos ditames da "lei divina", que prescreve o sepultamento digno ao cadáver, principalmente quando se trata de um irmão de sangue. Mas ao cumprir a "lei natural" (jus naturae), desobedeceu à norma legal instituída pelos homens, ao Direito posto (jus positum) – ou melhor, imposto - pelo governante.”
Assim, o teatro na Grécia reproduz a forma de comunicar que reinaria até o advento da era digital: a do emissor para o receptor veiculando mensagem que, na sua origem, visa à perpetuação da ideologia de quem tem o poder.

1.2 O Político: Quem É - e como trabalha


A figura do político surge quando o tamanho das cidades e o número de seus habitantes tornam inviável a prática da democracia direta, como a idealizada na Grécia: aquela onde o povo na praça decide em assembléia o que é melhor para a vida em comunidade. Assim, representantes escolhidos pelo povo vão agir em nome dele. Esse é o político, aquele que em nosso nome vai decidir sobre os destinos da maioria, sobre as obras e serviços que necessitamos e sobre as leis que vão reger a vida em sociedade.
O político é figura essencial no sistema de governo da democracia. No mundo contemporâneo, a democracia está estreitamente relacionada à escolha dos governantes em eleições livres; mas, no passado o conceito era entendido em seu significado mais literal, representando a reunião dos cidadãos em praça pública, numa assembléia, para debater questões políticas e deliberar leis. Nessa acepção, torna-se impraticável em sociedades maiores do que as cidades-Estado como as da Grécia antiga.
O sistema representativo surgiu para tentar resolver esse problema. Nas democracias representativas, a grande discussão tem sido se, na prática, a representação aproxima-se do sentido original da democracia. E se a participação popular através de referendos, plebiscitos e outros dispositivos semelhantes seria o sistema mais próximo daquele preconizado pelos gregos.
Para que os governos democráticos se mantivessem estáveis, discutiram-se amplamente quais as condições sociais necessárias. Entre os fatores discutidos, o mais importante seria o desenvolvimento econômico: as sociedades capitalistas avançadas são, quase na totalidade, democracias representativas, enquanto muitos países em desenvolvimento (a Índia é uma importante exceção) possuem governos autoritários, os quais em geral auto-afirmam-se democráticos apesar de tudo. Na prática, observa-se porém que a relação entre desenvolvimento econômico e democracia não é direta. E que é preciso levar em conta fatores como o domínio econômico e também político que os países capitalistas mais adiantados exerceram sobre grande parte dos atuais países em desenvolvimento.
Para representar a população, o político teoricamente vai escutá-la, assimilar suas demandas e desejos para transformá-los em ação.
Na verdade, a legitimidade da representação vem sendo questionada desde Jean-Jacques Rosseau. Será que a vontade geral pode ser alienada? Governantes não seriam apenas agentes e não representantes do povo? De outro lado, como crê hoje Saramago, ao eleger um representante, o povo não estaria agindo com a preguiça de quem não quer assumir responsabilidades, numa “abdicação” cívica” ?.
Mas, a necessidade de perpetuação do poder faz com que, na realidade analógica, o caminho seja exatamente o inverso: o político surge como um pop star, um mago que transmite sua mensagem para um público cativo, com o objetivo de manutenção de seu poder de representação. Ele então despeja informações que, se assimiladas, vão se transformar adiante no voto que assegurará a sua recondução ao poder.

1.3 A Política na Era Analógica


Para concretizar suas metas e obter a adesão, o apoio, a cumplicidade ou a simples aceitação do seu público-alvo (o eleitor), o político necessita comunicar-se. A comunicação, ou a troca de informação entre indivíduos, constitui um dos processos fundamentais da experiência humana e da organização social. As formas diretas e pessoais de comunicação vão se tornando cada vez mais raras, cedendo espaço para a chamada comunicação de massa, aquela que atinge grande número de pessoas. Num mundo super-populoso, o político que tentar se valer apenas da comunicação direta estará fadado ao desaparecimento do cenário, pois esse meio pessoal de transmissão de mensagem fica cada vez mais inviável.
Na era analógica, mesmo a comunicação de massa envolve o esquema tradicional, aquele encontrado desde os tempos do teatro na Grécia antiga. Ou seja: utiliza como elementos básicos um emissor, aquele que inicia o processo; um código para transmitir uma mensagem; um meio de transmissão, um sinal (ondas sonoras, letras impressas, luz), enviado por um determinado canal (veículo) a um receptor - destinatário final que vai decodificar a informação e interpretar o seu significado.
A escrita foi o primeiro passo no desenvolvimento dessa chamada comunicação de massa. Com a Imprensa, chegou-se a uma segunda revolução comunicativa: os jornais e livros em grandes tiragens podem transmitir mensagens a grande número de pessoas. E, finalmente, a tecnologia elétrica e eletrônica conseguiu ampliar ainda mais o público, atingido pelo rádio e pela televisão, pela indústria do cinema e pela fonográfica.
As mensagens têm suas características adequadas aos meios de comunicação de massa, que impõem seus próprios códigos, fazendo assim com que elas sejam variadas em teor, bem como na forma de expressão, indo das afirmações mais simples até textos complexos, de múltiplos níveis de significado e várias interpretações possíveis, mas todas contendo a ideologia da dominação.
Da escrita inicial à era eletrônica avançou-se em sofisticação tecnológica, em funcionamento em escala empresarial e industrial e em alcance cada vez maior e impensável em tempos idos. Os meios de comunicação de massa disseminam informação e entretenimento para um público potencialmente universal. Exercem forte influência na vida política, econômica e cultural.
São vários os fatores que determinam o teor das mensagens, a forma com que são transmitidas e recebidas pelo grande público e o impacto que têm sobre os indivíduos e a sociedade. Um deles é o critério de seleção de notícias a serem transmitidas. A existência de vários tipos de censura (seja a oficial, seja a ditada pelos interesses econômicos) vai determinar a qualidade da atividade jornalística e, consequentemente, (de)formar a sociedade, e sua capacidade de registrar informações e notícias.
Se no mundo da era analógica os meios de comunicação de massa criaram a aldeia global, uma sociedade de maior consenso e maior participação pública, de outro lado também geraram passividade e alienação.
O controle dos meios de comunicação pelos governos afeta diretamente a informação. E a criação de grandes impérios empresariais de comunicação, formados a partir de fusões, a integração dos processos de produção e distribuição da informação, operando em níveis mundiais, acabaram por afetar ainda mais a qualidade dessa informação.
Há extenuantes debates sobre o grau de influência exercida pelos meios de comunicação, e que tipo de controle social poderia ser feito para evitar a manipulação. Nas décadas de 70 e 80 tomou corpo movimento mundial contra o chamado imperialismo cultural que esses meios estariam promovendo. Mas, apesar de todos os protestos e por mais que se criem formas de controle externas, seu poder sobre a opinião pública e de transmissão da ideologia da dominação é inegável. Um poder que aumenta com a centralização cada vez maior do setor.
Propostas feitas por países não-desenvolvidos, que buscavam uma nova ordem mundial da informação, acabaram fracassando por se chocarem com o princípio da liberdade de imprensa.

CAPÍTULO 2 – A SOCIEDADE EM REDE


2.1. Os Meios Digitais e A Interatividade


O espaço das comunicações por redes de computação é chamado de ciberespaço. É onde se trabalha exclusivamente com valores binários. Até seu advento, a comunicação era analógica, ou seja, representada por grandezas nas quais um sensor ou indicador acompanha de forma contínua, sem hiatos nem lacunas, a variação da grandeza que está sendo medida ou representada.
Com a comunicação ciberespacial veio a interatividade, que é a possibilidade de diálogo intercambiável entre o usuário de um sistema e a máquina, mediante um terminal equipado de tela de visualização.
Os meios digitais inverteram e misturaram as mãos de direção do tripé básico da comunicação na era analógica: emissor-mensagem-receptor. Na comunicação digital, o primeiro e o último se confundem enquanto a mensagem vai e volta modificando-se velozmente. Onde começa a emissão? Onde termina? A sociedade em rede não deixa que o fio da meada se desvende. Não importa onde a informação se originou, mas como ela está circulando modificada sabe-se lá por quem e por quantos!
No novo espaço de comunicação, mudam-se os papéis do esquema clássico, surgindo a interação entre as partes. Uma inter-ação que modifica a mensagem e faz emissor e receptor mudarem de status, não apenas numa simples inversão, mas numa posição que permite a que eles exerçam os dois papéis simultaneamente.
Cria-se um novo paradigma na teoria da comunicação. Na teoria clássica, um conteúdo informacional é uno e baseado na performance da emissão e na transmissão sem distorções, mesmo que ruídos existam e a recepção seja, digamos assim, “falha”. Na comunicação interativa cria-se uma multiplicidade complexa, com a participação do receptor, o que resulta numa informação manipulável, que sofre permanente intervenção. Nessa situação, a informação não é mais um dado que precisa ser distribuído de forma eficaz, mas sim um produto que precisa ser trabalhado.
No ciberespaço podem-se atingir ao mesmo tempo diversos receptores, mas o público não é mais anônimo e isso vai permitir uma personalização do conteúdo, de forma a atender (ou procurar atender) a necessidade de cada receptor. Esse retorno maior do receptor é a interatividade. Trata-se de comunicação, segundo Lévy, “conforme um dispositivo todos para todos”.
Como destaca Marco Silva, que evoca M. Marchand ao falar da alteração dos fundamentos teóricos da comunicação com o advento da era digital e a interatividade,

“ a mudança que ocorre com a emergência da modalidade interativa de comunicação que estaria tomando o centro da cena ocupado em todo o século XX pela modalidade comunicacional centrada na transmissão, na distribuição, que são os fundamentos da mídia de massa: cinema, imprensa, rádio e TV. Trata-se, portanto, de verificar o que muda no estatuto do receptor; o que muda para ele em termos de participação-intervenção; o que muda quando a mensagem muda de natureza e o emissor muda de papel. Ao mesmo tempo, é preciso enfatizar que tal mudança supõe redefinição de estratégias de organização e funcionamento da mídia de massa e de todos os agentes do processo de comunicação.”

Segundo esse estudioso, na perspectiva da interatividade o então receptor passa de consumidor passivo a ativo, “na medida em que os meios dessa atividade estarão ao alcance de sua mão".
A demanda social por interatividade faz aperfeiçoarem-se as tecnologias interativas. Novas gerações de aplicativos para a Internet surgem, mais simples de serem utilizados e com preço cada vez mais acessível. Há cada vez maior integração entre vídeo, áudio e texto num terminal capaz de enviar, receber e tratar a informação.
As visões opostas e radicais de Jean Baudrillard e de Paul Lévy acerca dos efeitos da interatividade são lembradas no estudo de Marco Silva, com o primeiro acreditando no domínio da máquina sobre o homem, enquanto Lévy sonha com a sociedade ideal, preconizada pelos marxistas, de domínio do homem sobre os meios de produção. Baudrillard fala num dilema entre o homem e a máquina e descrê da ação humana: "Não há interatividade com as máquinas (tampouco entre os homens, de resto, e nisso consiste a ilusão da comunicação). A interface não existe. Sempre há, por trás da aparente inocência da técnica, um interesse de rivalidade e de dominação."
A visão assustada de Baudrillard choca-se com a poética de Lévy, para quem, no ciberespaço,


"a liberdade toma forma nos softwares de codificação e no acesso a múltiplas comunidades virtuais, atravessando fronteiras, enquanto a fraternidade, finalmente se traduz em interconexão mundial". E diz mais: o ciberespaço permite realizar uma meta marxista: "a apropriação dos meios de produção pelos próprios produtores". Isto é, a produção aí consiste essencialmente em simular, em tratar a informação, em criar e difundir mensagens, em adquirir e transmitir conhecimentos".

As novas tecnologias comunicacionais criam um novo mundo de participação que, paradoxalmente, embora ocupe espaço virtual, na prática pode resultar em realidade bem mais palpável que a encenada pelos detentores do poder de informação. O usuário dispõe não só do instrumento de participação, mas também de intervenção.
Cria-se uma nova experiência de conhecimento, impensável com as antigas formas de comunicação. Abre-se a possibilidade de alteração do conteúdo e a criação de caminhos diversos, nunca jamais igual a outro.
É a individualização, a personificação assegurando uma democracia, no sentido do poder do povo, pelo povo e para o povo como a idealizada originalmente na Grécia Antiga.

2.2. Comunicação Analógica e Comunicação Digital: Uma Ruptura


Parafraseando Caetano Veloso, “enquanto os homens exercem seus podres poderes” não se dão conta do quanto a realidade virtual pode transformar a vida real. Enquanto a guerra continua, jovens utilizam a Internet em diálogos que pareciam impossíveis e que nos fazem crer que a era digital possibilitará o advento da paz.
É emblemático o que ocorreu durante o recente conflito entre Israel e o Líbano. Conforme relato do correspondente de guerra Jean-March Manach , blogs e fóruns de discussão criaram um diálogo inimaginável nos conflitos ocorridos antes do advento da rede mundial.
No espaço virtual, jovens libaneses e israelenses dialogam sobre a guerra e se compreendem de uma forma que a guerra, real, passa a parecer encenação, e a realidade é o mundo virtual que acontece na rede (Anexo A). Eles não se sentem inimigos, mas sim vizinhos.
Na comunicação analógica esse diálogo não ocorreria jamais. A mensagem seria veiculada conforme o interesse dos detentores dos meios de comunicação, de um lado. E, de outro, o receptor passivamente absorveria ou se rebelaria em relação àquela visão totalitária porque colocada apenas sob o ponto de vista único do poder. É o modelo da mídia convencional, no qual produção e distribuição da mensagem seguem o modelo “de um para todos”.
A era digital rompe e subverte as formas de produção e distribuição das informações, passando a vigorar, com a interatividade, o modelo “de todos para todos”. Até mesmo na chamada “governança eletrônica” ou e-gov, que é o uso da tecnologia da informação no relacionamento dos governos com a sociedade, há esse rompimento na forma tradicional de comunicação entre governantes e governados. Estes usam a ferramenta que lhes permite alterar conteúdos das mensagens e dialogar com algo (representação do poder) que, na comunicação analógica, parecia (e na prática ficava) muito distante. Com essa interferência, os governados podem gerar mudanças de rotas e direcionamento de administrações públicas, se no comando destas houver políticos preocupados - mesmo fora de períodos eleitorais – em ir ao encontro da satisfação de demandas sociais.
No governo eletrônico, a população opina em tempo real. O político tem que ser menos ativo, mas melhor executivo no sentido estrito de executar o que a maioria quer. Nessa nova era, o político passa de caudilho a articulador.

2.3. A Política Na Era Digital


Dentro desse contexto de interatividade, de diálogos entre supostos “inimigos” e de possibilidade de intervenção no meio, caem cada vez mais as barreiras criadas pelos conceitos de nação e de valorização da cultura própria, com desdém do que vem de fora. A xenofobia é enterrada, as fronteiras desaparecem cada vez mais e a cibercultura (aqui no seu conceito dos agenciamentos sociais das comunidades no espaço eletrônico virtual) vai ampliando sua ação positiva e pacifista na essência.
As tecnologias de comunicação estão possibilitando maior aproximação entre as pessoas de todo o mundo.
A cibercultura provém de um espaço de comunicação mais flexível que o produzido nas mídias convencionais (TV, Rádio, Jornal, Cinema). Se desdobra no contexto do todos-todos, “surgindo com a força que comporta o discurso democrático em sua gênese” (in wikipedia).
O movimento migratório mundial, tendência natural de os povos se misturarem em busca de solução de seus problemas, cresce com o incremento do transporte. Cresce junto a difusão da cultura de massa. O chamado “estado nacional” acaba perdendo sua identidade.
Como lembra o professor Massimo Di Felice, “o Brasil é a grande metáfora do mundo: povos de distintos idiomas, religiões, raças se misturam, um lugar estratégico, um laboratório para a construção da cidadania mundial por causa da sua multiplicidade cultural, étnica e lingüística”.
Essa “babel brasileira” é o exemplo do convívio cultural maximizado com a tecnologia da informação. É ela que permite o conhecimento, a comparação, a reflexão e, muitas vezes, a mudança de comportamentos. Na comunicação analógica, a monogamia européia, por exemplo, não era confrontada com culturas poligâmicas.
Todo esse quadro não pode ser ignorado pelos agentes da política. O papel da mídia não é passivo. No modelo dialógico-digital dessa sociedade pós-televisiva a comunicação compete às massas. E, para não sucumbir, o político tem que se tornar interativo e enterrar o discurso antigo, que se tornou obsoleto.

CAPÍTULO 3 – IMPACTO DAS NOVAS TECNOLOGIAS


3.1. Pós-Política De Comunicação: Novos Tempos


Para o bem ou para o mal, os “hackers” mostram a característica de transparência da tecnologia: nenhuma rede é indevassável, nenhuma pode ser censurada. As novas tecnologias anunciam a nova era: a da pós-política de comunicação.
São novos tempos que nos fazem crer, numa análise otimista, que a era digital possibilitará o advento da paz. Exemplo disso é o inimaginável diálogo virtual entre jovens de dois povos beligerantes (Anexo A).
A chamada pós-política de comunicação se insere na nova ordem mundial, da globalização e como um dos resultados das profundas transformações geradas pelo processo de desenvolvimento do sistema capitalista.
Manuel Castells explica o processo de surgimento da sociedade pós-industrial, a composição dos elementos concretos do novo paradigma da tecnologia da informação e sua incorporação ao processo de trabalho. Conforme sua análise, o homem desenvolve a tecnologia para atuar sobre a informação, que faz parte de toda atividade humana. Predomina a lógica de redes: flexibilidade, capacidade de reconfiguração, de convergências e emanações, num movimento contínuo e simultâneo de fusão e cisão de sua matéria-prima, resultando em novas e mais informações.
Com isso, eleva-se o patamar dos conhecimentos da sociedade com grandes avanços para a vida individual e coletiva.
Como destaca Jorge Werthein, a sociedade pós-industrial permite realizar com rapidez e eficiência os processos de desregulamentação, privatização e ruptura do modelo de contrato social entre capital e trabalho característicos do capitalismo industrial. Mas, alerta:

“O foco sobre a tecnologia pode alimentar a visão ingênua de determinismo tecnológico segundo o qual as transformações em direção à sociedade da informação resultam da tecnologia, seguem uma lógica técnica e, portanto, neutra e estão fora da interferência de fatores sociais e políticos. Nada mais equivocado: processos sociais e transformação tecnológica resultam de uma interação complexa em que fatores sociais pré-existentes, a criatividade, o espírito empreendedor, as condições da pesquisa científica afetam o avanço tecnológico e suas aplicações sociais”.







3.2. Mandato Em Tempo Real: Conectado Com O Eleitor


Talvez o meio mais rápido de comunicação entre o político e o eleitor seja o blog, uma das infinitas ferramentas e possibilidades da rede mundial de comunicação. Os diários virtuais são o espaço onde as pessoas podem “declarar quem são, o que querem e o que pensam”, na definição do jornalista e blogueiro americano John Batelle, em matéria da revista Época.
Qualquer pessoa pode manter um blog na internet. Milhões de milhões de blogs se entrecruzam e se relacionam. É a blogosfera. A reportagem da revista Época destaca:

“O tamanho da blogosfera é impressionante. O número de blogs em todos os idiomas é hoje 60 vezes maior do que era há três anos e já ultrapassou a marca de 40 milhões de páginas. De acordo com o site Technorati, que cataloga e faz buscas em blogs no mundo inteiro, são criados 75 mil blogs por dia. Isso dá uma média de um novo blog por segundo. Há um blog para cada 25 pessoas on-line. Segundo o Pew Internet & American Life Project, instituição americana que estuda o impacto da internet, 57 milhões de internautas dos Estados Unidos lêem blogs diariamente. Eles são abastecidos por cerca de 1,2 milhão de novos conteúdos por dia, ou uma média de 50 mil por hora. No Brasil, dos quase 20 milhões de internautas, estima-se que algo como 25% vasculhem blogs todo dia em busca de informação ou entretenimento”


Se, de um lado, contesta-se a credibilidade da web, que aceita qualquer informação como verdadeira, de outro, paradoxalmente, nenhum espaço é mais rápido para o desmascaramento que a Internet.
Os blogs e sites são um instrumental político dos mais eficazes e, como a atuação de hackers, para o bem ou para o mal, elegem e destroem os políticos. Como afirma o blogueiro Nemo Nox, um dos pioneiros da blogesfera no Brasil, em entrevista ao site Congresso em Foco (Anexo B) os blogs políticos representam “um progresso gigantesco no cenário político”, na medida em que permite o surgimento de “vozes individuais com poder cada vez mais comparável ao dos grandes interesses econômicos”. Nox assinala:

“Em muitos casos, são esses cidadãos que estão fazendo o trabalho que deveria ser da mídia. Um político publica uma foto mostrando a calma no centro de Bagdá, palco de uma guerra controversa, e os blogueiros logo descobrem que na verdade era uma foto de Istambul, na Turquia. Um grande jornal contrata um jovem republicano e os blogueiros descobrem seu passado de plágios descarados, forçando uma demissão rápida. Sem a blogosfera, muitos episódios desses passariam sem resposta.”
Exemplo desse “poder de destruição” pode ser a derrota da candidata à reeleição a deputada federal, Ângela Guadagnin, em outubro último. Como em abril deste ano já vaticinava o jornalista Manuel Alves Fernandes:


“Duraram bem mais do que os quinze minutos de fama de Andy Warhol a estranha dança da deputada federal Ângela Guadagnin (PT-SP) para comemorar na madrugada do dia em que o plenário da Câmara dos deputados absolveu seu colega de bancada João Magno, em 22 de março, acusado de participar de atos de corrupção.
Na sociedade em rede, a velocidade da informação que devora os fatos produziu vômitos: a dança foi reproduzida nos noticiários on line, em sites, blogs e portais, transformando-se num exemplo de falta de decoro que ainda respinga pouco mais de um mês depois do episódio. Há quem julgue que se refletirá nas eleições de outubro próximo com os efeitos políticos que podem lembrar à história os exemplos do baile da Ilha Fiscal que derrubou o império e facilitou a proclamação da República.”


O segredo do sucesso dos blogs e sites políticos é a interatividade, que permite que o dono do espaço reavalie quase que em tempo real sua posição, adaptando-a ao que quer seu (e)leitor. Alguns políticos se anteciparam aos demais e, enxergando a audiência dos blogs, criaram os seus próprios “diários” na web, anos antes da maioria tê-lo feito. No Brasil, são considerados precursores dos blogs os cariocas César Maia, prefeito e Fernando Gabeira, deputado federal. Nos EUA, o democrata, ex-vice-presidente e candidato à Presidência, Al Gore.
Para ter êxito, o blog necessariamente tem que ser atualizado. O internauta é tido como volúvel e, caso encontre depois de algumas horas o conteúdo do qual já tomara conhecimento, pode nunca mais acessar aquele espaço. A rapidez na renovação das informações e comentários é cada vez maior. Se há poucos meses o internauta exigia uma atualização diária de conteúdos, hoje essa exigência já subiu para duas vezes ao dia.
Essa velocidade de atualização de conteúdo tende a ser cada vez maior, na medida em que estar conectado à rede mundial de computadores não é mais uma situação especial, agendada, exercitada como uma tarefa em determinado horário. Hoje, o micro, de banda larga (e, portanto, conectado em alta velocidade) é quase que uma extensão do homem em casa e em seu ambiente de trabalho. Ele está conectado mesmo quando executa outra tarefa.
Já em 2004, o relatório "Web Brasil" do Ibope/NetRatings apontava que cerca de 28 milhões de brasileiros com mais de 16 anos já navegaram na Internet pelo menos uma vez. O relatório mescla dados do acesso residencial à web com um levantamento telefônico para medir o uso da rede em casa, no trabalho, escolas e locais públicos de acesso.
Segundo Paulo Lemos, o Brasil pode ser considerado uma das mais importantes economias emergentes em termos do mercado Internet global.
Ao mesmo tempo em que executa seu serviço, onde mantém seu emprego, o homem moderno está acompanhando os sites e blogs de sua preferência.
Como afirma Mário Lima Cavalcante, no seu artigo “Eficiência na blogosfera”, citando a consultora alemã em mídia interativa, Katia Riefler, “os blogs possuem uma audiência tão grande quanto a das mídias tradicionais”. E é inegável que formadores de opinião lançam mão cada vez mais da web. Acessam não apenas os principais jornais digitais, mas também sites e blogs políticos.
Alessandra Aldé e Juliano Borges lembram que, como atores influentes na produção do noticiário, e consequentemente da cultura política, “os jornalistas recorrem crescentemente à Internet como fonte de informação, o que torna a rede um novo campo de disputa política”.
No site do Observatório da Imprensa, em 29 de agosto de 2005 Carlos Castilho já registrava, num artigo intitulado “Revolução conservadora na blogosfera”:

“A comparação do comportamento dos blogueiros nos Estados Unidos e no Brasil mostra que a preferência dos internautas está muito vinculada à conjuntura política do país. Mas, apesar da diferença de opções, tanto aqui como lá a politização dos blogueiros é um fenômeno em ascensão vertiginosa. Segundo a pesquisa do NPI, desde o final de 2002 o tráfego de visitantes nos mil blogs políticos mais populares dos Estados Unidos passou de 500 mil para três milhões de visitas diárias. Não temos aqui uma medição parecida, mas o blog do jornalista Ricardo Noblat não pára de bater recordes de audiência desde o início do mensalão, segundo o seu editor.”

Um site político de grande audiência entre os formadores de opinião é o Congresso em Foco, que se dedica a cobrir os bastidores do poder no Congresso Nacional. O conteúdo, a navegabilidade e o design já renderam premiações à página, que acabou se tornando referência na cobertura de atividades da Câmara e do Senado. A sua cobertura jornalística do dia-a-dia vem servindo como fonte de informação para a própria imprensa.

3.3. Além Do Político: Adaptação à Era Digital


A participação na rede é muito mais subjetiva e solitária que a antiga forma de comunicar, mais coletiva. Agora, individualmente, o internauta decide o que quer e como quer. Passou da postura passiva que lhe dava uma identidade para a busca da identificação com os conteúdos das informações.
A era digital é a da comunicação rizomática, onde a informação se capilariza para (in) formar e divulgar opiniões. No espaço discursivo virtual, onde milhões de blogueiros reagem entre si, alterando conteúdos, numa troca frenética de informações, numa dimensão mundial, imprime-se à Imprensa em geral uma característica inimaginável quando das três primeiras revoluções comunicativas.
Os agentes públicos não ficaram imunes a essa nova era. Ao contrário. A interatividade gera uma fiscalização sobre a atividade dos representantes políticos que expõe claramente qualquer deslize.
Aqui não cabe discutir sobre a (falta de ) credibilidade do conteúdo da rede. O uso da própria rede como instrumento de documentação de livre consulta e a velocidade do meio fazem com que as inverdades não durem tempo suficiente para destruir o trabalho e/ou a imagem de uma figura pública. Bem diferente, por exemplo, do impresso, onde uma retratação 24 horas depois (ou uma semana depois, no caso de revistas semanais) dificilmente sana os danos causados, sem contar que o primeiro papel onde a mentira está estampada tem uma duração e possibilidade de utilização bem mais longa que um ambiente virtual cujo teor tenha sido deletado (*).
Nesses novos espaços políticos, nos quais a realidade virtual será a virtualidade real, ocorre a convergência de tecnologias para criar redes competentes. E a comunicação passa a ser mediada pela tecnologia digital (cabos, fibra ótica, satélite, onda de radio).
O meio ambiente, termo tão em voga na década de 70 na luta da preservação da ecologia, hoje é o ambiente mídia, onde os movimentos sociais (inclusive ecológicos) são potencializados pelas redes.
O político adaptado à era digital sabe como atuar nesses novos espaços políticos, na Internet, na TV Digital, no DVD, criando discursos apropriados aos veículos que surgem na convergência desses meios digitais.
Se na era industrial o valor estava no trabalho manual, na sociedade dos novos tempos a informação é esse mais importante valor. Como afirma o professor Carlos Bottesi, “informação é como energia - só é transformada”.
Em menos de cinco anos, o conceito de broadcasting foi substituído por um novo modelo de mídia de massa, segmentado conforme a demanda e abordagem sistêmica. Forma-se uma rede de redes, onde as redes distintas ( telefonia, provedores de acesso, CD, DVD, VCD, VoiceP, Ipod TV Digital, radio etc ) tendem a estar integradas na forma de um sistema.
É a gênese de um novo mundo, propugnada por Castells. Na cultura da economia informacional e da virtualidade real, o político que não existir no ambiente mídia não sobreviverá.
(*) A recuperação desses dados apagados é possível, mas ainda restrita à esfera dos técnicos e não acessível para a maioria dos internautas-NA .


CONSIDERAÇÕES FINAIS


A ruptura no esquema tradicional de comunicação, com a formação das redes e a simultaneidade de papéis exercidos por emissor/receptor, como se procurou demonstrar, fará com que o tradicional discurso político não sobreviva. O trabalho de marketing político, que busca seduzir o eleitor para obter o seu voto, também terá de adaptar-se ao novo cenário da comunicação interativa.
Até os dias atuais, o marketing político e o marketing em geral usam o esquema de comunicação da era analógica: emissor transmite mensagem através de um meio de comunicação para atingir seu público-alvo - o receptor para, ao final, fazer com que ele compre o produto divulgado - ou vote no candidato cujas qualidades foram enaltecidas, no caso do marketing eleitoral.
Em tempos de comunicação dialógica, esse modelo está fadado ao fracasso. Na medida em que as informações são atualizadas em tempo real e as opiniões também são formuladas quase que simultaneamente entre os vários emissores/receptores, a competência, eficácia e prestígio do político passam a ser maiores quanto maior for sua capacidade de agir ou de articular em favor da concretização das demandas do público. Nesse sentido, sepulta-se o modo de ser caudilho do político. O discurso da dominação é substituído pela interatividade e pelo diálogo permanente, no qual a capacidade de articulação passa a ter um poder muito maior que a de convencimento.
Retomado o conceito de Bobbio, Matteucci e Pasquino, o de Política intimamente ligada ao Poder, e se este for definido como a dominação que um homem impõe a outro, o político como o conhecemos desaparece nesse novo cenário da comunicação.
Ignorar a cada vez maior audiência da Internet, em especial no cenário da política, é não fazer uma leitura correta do mundo da comunicação, da modernidade e do uso das novas tecnologias.
A interatividade, a disseminação veloz e de efeito multiplicador com alcance global e o multiculturalismo dentro do espaço cibernético estão rompendo preconceitos e fronteiras e criando novas formas de representação popular. O cidadão do mundo exige que, muito além do político, seu representante seja aquele capaz de executar melhor e mais rapidamente o que seu eleitor demanda.
Nesta era da “pós-política de comunicação”, o cidadão tem acesso à informação onde quer que esteja. Embora a informação seja “de todos para todos”, o “diálogo” se dá de uma forma muito individual. Cresce o nível de exigência. A sociedade se organiza em segmentos de interesses comuns e isso transforma a forma de comunicar e as demandas.
A história nos tempos atuais é construída mais pelo conjunto da transformação tecnológica que pelo coração e mente dos homens. O povo é cada vez mais soberano. O discurso do candidato em busca do voto do eleitor, baseado puramente em palavras, deve transformar-se, em pouco tempo, em pergaminho inserido num microchip que fará parte de um museu virtual onde crianças vão rir daquela forma primitiva de comunicar.
O político contemporâneo não pode ignorar esse novo cenário. O “discurso” do novo político deve ser muito mais de interação com as demandas dos vários segmentos; e de agir para a sua concretização que fazer a narrativa propositiva.
A convergência de mídias, a velocidade na troca/reações da informação, a “flexibilização” de conceitos e o multiculturalismo estão exigindo uma nova postura de quem pretenda representar a sociedade.
O político do futuro deve se preparar para o descontínuo, característico da era digital, em contraposição ao contínuo no tempo da analógica. Deve saber que a “accountability” exigida na democracia como a conhecemos e a acreditamos será substituída pelo saber das ciências humanas. Um saber que acabará com o mito da transparência, como afirma Vattimo. Esse mito será substituído pela plena consciência da pluralidade das narrativas e interpretações; a consciência de que fazemos parte de universos culturais variados, que nos permitem a emancipação libertária e a “consciência aguda” da nossa limitação.


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(http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-19652000000200009&lng=es&nrm=iso)
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http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br//

http://www.gabeira.com.br/blog

http://revistaepoca.globo.com/

http://www.compy.com.br/

http://www.discoverybrasil.com

http://pt.wikipedia.org/ e http://www1.uol.com.br/bibliot/enciclop/


ANEXO A (*)


Libaneses e israelenses dialogam na Internet
subtitulo = 'Por meio de blogs e de fóruns de discussão, internautas "inimigos" trocam idéias, discutem, polemizam e acabam se entendendo quando sobressai o lado humano';
if (subtitulo.length > 2) { document.write (''+subtitulo+'') };
Por meio de blogs e de fóruns de discussão, internautas "inimigos" trocam idéias, discutem, polemizam e acabam se entendendo quando sobressai o lado humanoJean-Marc Manach

Em 2003, Salam Pax, o pseudônimo de um blogueiro iraquiano, permitiu que milhões de internautas pudessem acompanhar, em tempo real a partir de Bagdá, os avanços da ofensiva das tropas americanas. Inúmeras polêmicas tomavam conta então da "blogosfera", onde predominavam os seguintes temas de discussão: tinham os Estados Unidos razão ou não de entrar em guerra, ou ainda, será que se tratava de uma invasão ou de uma liberação? Então, as atenções se focalizaram no blogueiro iraquiano, não só porque ele escrevia em inglês, e com um real talento, mas também porque não havia praticamente nenhum outro blogueiro iraquiano naquela época.O que muda com a guerra no Líbano é que já existem inúmeras páginas equivalentes à da Salam Pax, tanto do lado libanês quanto do lado israelense. Eles são tão numerosos que foram criados sites só para recenseá-los e classificar as notícias que eles produzem, de modo a facilitar sua consulta: Jblogosphere e Webster do lado israelense, OpenLebanon ou ainda o Lebanese Blogger Forum do lado libanês. Além disso, o site The Truth Laid Bear, por sua vez, recenseou os blogueiros dos dois lados da fronteira, assim como os palestinos.Muitos sites e blogs trazem calendários internacionais de manifestações pró-israelenses e pró-Líbano, informações práticas (números de telefone de emergência, coordenadas da Cruz Vermelha ou de bancos de sangue), fotos e vídeos de propaganda, além de muitas imagens que não foram divulgadas pelos meios de comunicação ocidentais porque elas poderiam chocar.Seguindo a opinião dominante dos seus concidadãos, os blogueiros israelenses apóiam, na sua maioria, a ação de Tsahal (como é chamado o exército do país) e se preocupam principalmente com os mísseis do Hizbollah. Outros denunciam a percepção distorcida da comunidade internacional, o que motiva IsraPundit, por exemplo, a assimilar a rede americana de notícias CNN a um órgão de propaganda do Hizbollah.Do lado libanês, predominam a incompreensão e a cólera frente à violência dos bombardeios israelenses, a indignação diante do número de civis mortos (BloggingBeirut) e a impressão de que é o seu próprio país, mais do que apenas o Hizbollah, que Tsahal quer destruir (Stop Destroying Lebanon).Contudo, o mais marcante é que muito além das diatribes ideológicas e das reações epidérmicas, os elementos de um verdadeiro diálogo estão começando a surgir entre internautas israelenses e libaneses. Deixando de lado as suas divergências políticas, eles se valem do lado humano, para não dizer íntimo, dos blogs, para estabelecer uma troca de idéias que nenhum meio de comunicação tradicional poderia permitir.
"Com a Web, a guerra se personifica" Ramzi, 27, vive em Beirute. O primeiro texto postado no seu blog, que foi criado há apenas dois

(*) Do site Observatório da Imprensa. Página capturada em 24/07/06
anos, manifestava a dificuldade de viver num país que vinha sendo invadido pelos turistas, de tal forma que se tornara difícil até mesmo sentar-se no terraço de um café. No início de julho, ele relatava o fato de que, na espera de um visto, ele era obrigado a anular e remarcar constantemente suas passagens de avião, e a dizer toda hora "até logo" aos seus amigos.Hoje, ele comenta no seu blog a "agressão israelense" por meio, entre outros, de recriações ou adaptações publicitárias impregnadas de humor e de poesia. Vários israelenses lhe escreveram, em forma de comentários, para denunciar o "desperdício" causado por esta guerra, manifestar sua compaixão, expressar sua torcida por uma rápida resolução do conflito, e fazer apelos pela paz, entre "vizinhos". E Ramzi resume todas essas trocas de idéias com um comentário muito simples: "Com a Web, a guerra se personifica", por obra dos blogs, dos vídeos amadores postados na Internet, e também dos comentários que são postados pelos internautas.Para Lisa Goldman, uma jornalista canadense-israelense, e blogueira, que vive em Tel-Aviv, é a primeira vez que "cidadãos de países inimigos estão envolvidos desta forma numa conversa permanente, enquanto os mísseis continuam a cair". E os exemplos disso são abundantes. Assim, a primeira pessoa a reagir ao seu comentário dedicado à manifestação anti-guerra de domingo passado foi uma libanesa que denuncia o estado de sítio, a destruição do seu país e a morte de civis, mas que também acrescenta que "com pessoas como você, o diálogo prosseguirá, nós não temos escolha".Não contente de engendrar esse tipo de diálogo civilizado entre cidadãos de países em guerra, a Internet cria também situações muito mais perturbadoras, nas quais militares, e aqueles que os apóiam, são mantidos informados das conseqüências dos seus ataques por aqueles mesmos que eles bombardeiam.Assim, na segunda-feira passada (17/07), Shachar, um soldado israelense normalmente estacionado na fronteira libanesa, estava de licença para assistir a um enterro. Ele aproveitou a oportunidade para consultar o blog colaborativo, e muito acessado, dos Lebanese Bloggers, de maneira a se manter informado do que estava acontecendo do outro lado da fronteira: "Daqui, nós não podemos acompanhar todos os bombardeios que vêm sendo efetuados no Líbano [nós estamos mais interessados nas bombas que caem em Israel]".Quando o ódio arrefecer...Tempos atrás, numa dessas noites próprias para trocas de idéias na Web, Lisa Goldman, por sua vez, acabou se envolvendo num "chat" ao vivo com um libanês que ela conheceu por intermédio do seu blog. Sentado a uma mesa no teto do seu prédio em Beirute, ele lhe relatava suas impressões, enquanto os mísseis israelenses iam caindo sobre a cidade, "de uma maneira humana e pessoal, que nenhum artigo na imprensa, nenhuma reportagem televisiva jamais poderá expressar".De maneira mais geral, o que ressalta dessas conversas, conduzidas por meio de blogs e de comentários, entre israelenses e libaneses, é um sentimento de impotência e de tristeza diante deste conflito, das suas baixas entre civis, diante dos dirigentes dos seus países respectivos e dos seus aliados internacionais que os colocam diante do fato consumado.Sobressai também um sentimento de esperança, pelo simples fato de que, enquanto muitos blogueiros libaneses sentem um forte ódio atualmente em relação a Israel, e passaram a se recusar a fazer todo contato com os israelenses, a maioria daqueles que comunicam entre si não se consideram como "inimigos", e sim como "vizinhos".Em seus comentários, Lisa Goldman leva o raciocínio mais longe e acrescenta: "Quando o ódio arrefecer, quem sabe alguns se lembrarão das conexões pessoais que eles terão estabelecido com o seu 'inimigo'". E a blogueira se deixa levar pela esperança, sonhando que a próxima geração de políticos e líderes econômicos libaneses e israelenses possa ter beneficiado de tais relações íntimas.E Lisa conclui que "não é fácil matar alguém que você conhece como ser humano, e não só como um 'ex-inimigo".

ANEXO B (*)


Palavra de especialistaBlogueiro critica imprensa brasileira, diz que blogs políticos no país ainda engatinham e que a internet tirou da grande mídia o monopólio de formar opinião

Sylvio Costa


Com 43 anos de idade, o paulista Nemo Nox é um aventureiro. Nascido em Santos, já morou, entre outras cidades, no Rio, em São Paulo, Porto Alegre, Madri, Londres, Lisboa e Miami. Sua maior aventura, porém, está nos projetos que desenvolve ou desenvolveu na internet. Depois de trabalhar 12 anos em publicidade, produzindo e dirigindo comerciais para televisão, migrou profissionalmente para a internet em meados de década de 90. Na WEB, Nemo Nox transformou-se em lenda. Não apenas pelo mistério que faz em torno do seu nome de registro civil, que ele não revela. Apesar de ter trabalhado para grandes empresas do ramo (como a brasileira BOL e a norte-americana AXN), tornou-se conhecido, sobretudo, em razão de projetos que tocou pessoalmente, geralmente sem retorno financeiro. O primeiro deles, o blog "Diário da Megalópole", foi lançado em março de 1998 em São Paulo e é considerado o primeiro blog produzido em português. O mais recente, "Por um Punhado de Pixels", recebeu no final de 2004 da Deutsche Welle (DW), estatal de comunicação da Alemanha, o prêmio de melhor weblog do mundo. Mas a trajetória de Nemo na rede envolve a criação de sites culturais e do que ele chamou de "Pictoblog". Para acessar todos os trabalhos, atuais e anteriores dele, na internet, você pode ir ao endereço http://www.nemonox.com/. Dos Estados Unidos, onde mora atualmente, ou no Brasil, onde se encontra para obter documentos necessários à finalização do seu processo de imigração nos EUA, ele acompanha com interesse a evolução dos blogs brasileiros, a cobertura dos escândalos do governo Lula, além de estar sempre ligado naquela que é a sua grande onda: cultura, aí incluídos quadrinhos, cinema, música, literatura e tudo o mais.
Foi com toda essa bagagem que Nemo deu, por meio da troca de e-mails, a entrevista que segue ao Congresso em Foco. Ele fala que a imprensa do país sabe investigar e "tem revelado ao público muito dos bastidores podres da política brasileira". Mas, queixa-se: "A minha reclamação maior é que o interesse, muitas vezes, não parece ser a resolução dos problemas e sim o espetáculo montado ao redor dos escândalos, do aspecto bizarro, da secretária que quer aparecer na Playboy, da parlamentar que fez uma dancinha infeliz".
Também faz críticas aos blogs políticos brasileiros: "Em comparação com o que acontece nos EUA, eles ainda estão engatinhando. A parte das briguinhas partidárias é bem parecida, mas no Brasil ainda está faltando o ativismo que verifica tudo o que diz a mídia e que dizem os partidos, o blogueiro engajado que confere dados, faz pesquisas, expõe falhas e desmascara armações".

(*) Do site Congresso em Foco. Página capturada em 22/04/2006
Mesmo assim, o blogueiro saúda o fenômeno, acrescentando: "Não foi só o cenário político que mudou com a popularização dos weblogs. Houve fragmentação e multiplicação dos formadores de opinião, em todas as áreas. Isso tirou da grande mídia o controle sobre as discussões e abriu caminho para manifestações que antes, por vários motivos, não ganhavam destaque".
Para Nemo, "a impunidade no Brasil continua sendo a regra, mostrando a todos no país que é lucrativo e razoavelmente seguro ser corrupto". Ele completa: "O que me entristece é perceber um clima de conformismo na população, de 'o Brasil sempre foi assim', de 'vai acabar tudo em pizza mais uma vez'".
Leia a seguir a entrevista completa.
Congresso em Foco - Você tem acompanhado de alguma forma o noticiário sobre os escândalos que atingiram o PT e o governo Lula? Nemo Nox - Acompanho, tentando não me envolver muito. Como assim? Por que não se envolver? A maior parte das notícias sobre a vida política brasileira (e não só as que tratam de escândalos) provoca uma certa angústia. Eu tento não me envolver emocionalmente, principalmente porque estou numa fase de transição entre o Brasil e os EUA, no final do processo legal de imigração, e ainda tenho outras angústias políticas me esperando por lá. Como essas informações chegam aos brasileiros que vivem nos Estados Unidos, como você? Eu leio jornais e revistas do Brasil através da internet. E, claro, os blogs estão sempre apontando para notícias e artigos que merecem destaque. Muitas pessoas no Brasil, principalmente aquelas ligadas ao (ou com alguma simpatia pelo) PT, têm criticado a cobertura da imprensa brasileira. Elas alegam que há má vontade da imprensa em relação a Lula. Algumas chegam a falar em golpismo... Essas críticas lhe parecem justas? A imprensa exerce sobre o Lula uma vigilância que não exerceu em relação, por exemplo, a Fernando Henrique?Para mim, a mídia deveria manter-se sempre numa postura crítica em relação ao governo, qualquer governo, analisando coerência ideológica, cobrando promessas eleitorais, verificando como as verbas são aplicadas, pesquisando possíveis falcatruas, enfim, funcionando como um olho atento a serviço da população. Se há algum problema a apontar nesse sentido, então não seria o excesso crítico de hoje, mas sim o comportamento brando de antes. Você poderia apontar os pontos que considera mais fracos e mais fortes na cobertura que a imprensa brasileira faz dos escândalos políticos? A minha reclamação maior é que o interesse, muitas vezes, não parece ser a resolução dos problemas e sim o espetáculo montado ao redor dos escândalos, do aspecto bizarro, da secretária que quer aparecer na Playboy, da parlamentar que fez uma dancinha infeliz para comemorar uma votação favorável. O aspecto mais positivo é certamente a vertente investigativa do jornalismo, que tem revelado ao público muito dos bastidores podres da política brasileira, com detalhes, documentos, gravações, depoimentos etc. De que maneira você, um pioneiro da chamada blogosfera, analisa a proliferação dos blogs e sites políticos no Brasil? Em comparação com o que acontece nos EUA, os blogs políticos brasileiros ainda estão engatinhando. A parte das briguinhas partidárias é bem parecida, mas no Brasil ainda está faltando o ativismo que verifica tudo o que diz a mídia e que dizem os partidos, o blogueiro engajado que confere dados, faz pesquisas, expõe falhas e desmascara armações. Você pode citar exemplos de blogs ou sites que cumprem bem esse papel no EUA ou em outros países? Existem muitos. Aqui vão alguns que acompanho: Crooks and Liars, Daily Kos, Eschaton e Talk Left. Essa possibilidade de interferir na cena política é, no seu entender, a principal mudança ocorrida na blogosfera desde que você lançou seu primeiro blog? Que outros aspectos importantes você destacaria em relação ao fenômeno? Não foi só o cenário político que mudou com a popularização dos weblogs. Houve fragmentação e multiplicação dos formadores de opinião, em todas as áreas. Há dez anos o que tínhamos para ler sobre cinema, por exemplo, era o que diziam os mesmo críticos dos mesmos grandes veículos. Hoje cada um seleciona seus blogueiros preferidos para pegar dicas sobre filmes, livros, música, restaurantes etc. Isso tirou da grande mídia o controle sobre as discussões e abriu caminho para manifestações que antes, por vários motivos, não ganhavam destaque. Os blogs e sites aumentam a confusão, os ruídos de comunicação, a difusão de versões não comprováveis ou dão vida à democracia e possibilitam às pessoas participar mais da vida política? Eu considero um progresso gigantesco no cenário político termos vozes individuais com poder cada vez mais comparável ao dos grandes interesses econômicos. Em muitos casos, são esses cidadãos que estão fazendo o trabalho que deveria ser da mídia. Um político publica uma foto mostrando a calma no centro de Bagdá, palco de uma guerra controversa, e os blogueiros logo descobrem que na verdade era uma foto de Istambul, na Turquia. Um grande jornal contrata um jovem republicano e os blogueiros descobrem seu passado de plágios descarados, forçando uma demissão rápida. Sem a blogosfera, muitos episódios desses passariam sem resposta. O ambiente político no Brasil é mais corrupto que nos Estados Unidos e outros países que você conhece? Acredito que corrupção, ou pelo menos a oportunidade de corrupção, existe em qualquer governo. O que muda é o grau de impunidade. Quando o político corrupto é exposto e punido pelo que faz, a corrupção tende a diminuir porque nem todos estão dispostos a correr esse tipo de risco. Parece óbvio, mas mesmo assim a impunidade no Brasil continua sendo a regra, mostrando a todos no país que é lucrativo e razoavelmente seguro ser corrupto. Mas obviamente a corrupção não é exclusividade brasileira, e basta dar uma olhada no relacionamento da administração Bush com empresas como Haliburton ou Lincoln Group para perceber que as coisas não vão bem nos EUA em termos de probidade política. Na internet, você parece dar prioridade a temas da cultura e do cotidiano: o que faz, o que lê, o que vê etc. Você considera adequada a maneira pela qual essas questões (da cultura e do dia-a-dia) são tratadas na mídia brasileira, seja a mídia online ou a tradicional?Acho a mídia brasileira paupérrima na área cultural. O press release se transformou na fonte principal da maior parte dos jornalistas, e tanto jornais diários como revistas semanais repetem sem pudor os mesmos factóides distribuídos pelas assessorias de imprensa. Existem exceções, claro, mas entre os veículos mais vendidos é difícil encontrar uma resenha que fuja da pasmaceira habitual. Perdão pela minha intrusão algo ingênua, mar por que você não gosta de usar seu nome verdadeiro e se apresenta na internet apenas como Nemo Nox? Nemo Nox é um nome tão verdadeiro como Woody Allen ou George Orwell, ou seja, simplesmente um nome artístico que ficou mais conhecido que o nome que está na certidão de nascimento. Isso tem a ver com sua paixão por quadrinhos, quer dizer, com a idéia de, sei lá, construir um personagem? E como a coisa funciona no dia-a-dia, com colegas de trabalho, amigos, a família etc.? Não é um personagem, é só outro nome para a mesma pessoa (lembra daquela frase do Shakespeare, "o que chamamos de rosa mesmo com outro nome teria igual perfume"?). Começou quase como uma brincadeira, mas acabei ficando conhecido como Nemo Nox na internet e o nome já está comigo há mais de dez anos. Vou ser intrometido de novo. Afinal, sou jornalista. Você ganha ou já ganhou dinheiro com seus blogs, ou sobrevive e sobreviveu com outras fontes de renda? Nunca ganhei dinheiro diretamente com meus sites e blogs, mas eles servem de vitrine para o meu trabalho. Comecei a blogar quando fui para São Paulo para assumir a posição de editor-chefe da redação do Trix em 1998. Depois disso, já fui webmaster no BOL (também em São Paulo), diretor de conteúdo no AXN (Miami Beach, EUA), e diretor de arte na Just-a-Click (Alexandria, EUA). Agora estou no Brasil finalizando meu processo de imigração para os EUA e me preparando para novas aventuras profissionais. Pelo que li no blog, você está viajando pelo Brasil. Quando voltará aos EUA? E o que está achando do que viu por aqui? A impressão é de que "está tudo na mesma"? Até onde você teve chance de perceber, como os brasileiros com quem você esteve estão reagindo à atual temporada de escândalos? Sim, estou no Brasil mergulhado na burocracia da fase final do processo de imigração. Em termos políticos, não vejo grandes mudanças além de mais um desencanto. Mais um grupo que se apresentava literalmente como a salvação da pátria e ao subir ao poder nada fez do que prometeu, pelo contrário. O que me entristece é perceber um clima de conformismo na população, de "o Brasil sempre foi assim", de "vai acabar tudo em pizza mais uma vez". Você sempre dá crédito a Vivane Menezes como a primeira brasileira que produziu um weblog. Mas, creio, o blog que ela criou (White Noise) não está mais no ar. Você sabe se ela continua, com o perdão da palavra, blogando? Onde poderíamos localizá-la? Não tenho contato com a Viviane. Durante algum tempo, eu fui apontado como o primeiro blogueiro brasileiro. Mas, depois de uma entrevista minha à extinta revista Play, a Viviane disse, também em entrevista à Play, que tinha iniciado seu primeiro blog (em inglês) um mês antes do meu (em português), e assumiu o posto de primeira blogueira brasileira. Não sei se ela continua blogando.